A grilagem do Legado: Por que MLK Jr. Nada tem a ver com a extrema direita?
Há poucas semanas atrás, a senadora Damares Alves se propôs a participar de uma promoção da agenda conservadora (leia-se fundamentalista), em terras americanas, falando para o público evangélico brasileiro que lá reside. São mulheres pagando e financiando uma proposição que visa inseri-las em uma Gileade (sim, a do Conto de Aia) pós-moderna. Naquela ocasião, Damares aproveitou para visitar o memorial em nome do saudoso pastor Martin Luther King Jr (MLK). Não somente isso: fez questão de registrar e divulgar tal visita.
O problema é que os ideais e as ideias de MLK são incompatíveis, sendo diametralmente opostos à ideologia rasteira abraçada pela senadora distrital. O registro, a divulgação da visita tem propósito, tem método. A apropriação (ou seria expropriação?), pela extrema-direita política, do legado de vultos da teologia pública do século XX, de pastores cujo orgânico pensamento segue ecoando na sociedade, objetiva normalizar o pensamento extremista. Fazem isso com Martin Luther King Jr. e também com Dietrich Bonhoeffer, para ficar em dois exemplos.
Logicamente que esta expropriação pode macular o legado de Bonhoeffer e MLKJr, que se opuseram fortemente à ideologia da extrema-direita, cuja versão religiosa é vista no Fundamentalismo. Aliás, me parece que eles não dialogaram com lideranças fundamentalistas; conversaram com lideranças conservadoras, que sempre se mantiveram distantes dos excessos praticados pelos fundamentalistas. Fica aqui a reiterada lição de que não há diálogo possível com fundamentalista, conquanto algumas lideranças do campo democrático insistam na defesa nesta cortina de fumaça.
Considero esta postura uma das mais perniciosas sobre o movimento evangélico no Brasil. Se os extremistas precisam de um apito, ei-lo. Sempre com tom alarmista, mas incapaz de enxergar os absurdos do governo de extrema direita, do qual a senadora (e não só ela) tem saudades. Jesus de Nazaré já nos alertaria: "guardai-vos do fermento dos fariseus".
E não se engane: MLKJr, motivo deste post, perpetuado na música PRIDE do U2, jamais se envolveria com a extrema direita.
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Pr. Dr. Sérgio Ricardo Gonçalves Dusilek é Mestre e Doutor em Ciência da Religião (UFJF/MG); Pesquisador do Núcleo de Estudos e Pesquisa em Filosofia da Religião, da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF/MG); Pastor na Igreja Batista Marapendi (RJ/RJ); Professor do Seminário Teológico Batista Carioca. Autor de Bíblia e Modernidade: A contribuição de Erich Auerbach para sua recepção e co-organizador de: Fundamentalismo Religioso Cristão: Olhares transdisciplinares; e O Oásis e o Deserto: Uma reflexão sobre a História, Identidade e os Princípios Batistas. Contato: sdusilek@gmail.com