Ainda sobre bruxas e crianças

Ainda sobre bruxas e crianças

A convivência dos santos no mundo nem sempre é fácil. Precisamos conviver com culturas que muitas vezes são diferentes e, em alguns momentos, contrárias à nossa em alguns aspectos. No Paraguai, por exemplo, do dia 31/10 ao dia 3/11 há datas comemoradas por distintos grupos. Nos três primeiros dias nada de novidade para nós brasileiros: Halloween, Dia de Todos os Santos e Finados. O quarto é surpreendente: aniversário do ditador Alfredo Strossner, presidente do país entre 1954-1989. Durante seu governo, era uma data com status de feriado nacional e ainda hoje há pessoas que festejam esse dia. Então, nesses quatro dias, os paraguaios convivem com uma festa pagã, dois feriados cristãos e outro de cunho político-ideológico. 

Como lidar com isso a partir de uma vivência cristã? Tratando especificamente do Halloween posso citar um exemplo. Semana passada estávamos entrando no condomínio onde moramos e havia uma legião (sem exagero) de crianças subindo a rua. Estavam todas fantasiadas. Havia sido organizada uma festa de Halloween pelos próprios moradores. 

Em casa já havíamos combinado de fazer algo para distrair nossa filha nesse dia. Tínhamos conversado com ela sobre isso, dizendo que não queríamos que ela participasse. Um vídeo que nos ajudou bastante nesse processo de elucidação e convencimento foi um do canal Minha vida é uma viagem. Ela gostou tanto do vídeo que assistiu várias vezes. Trocamos algumas ideias e ela concordou que, do ponto de vista bíblico, não parece ser razoável festejar a morte, pois ela é filha da luz.

Só que a história não acaba aí. Dias depois ela me pediu para assistir o filme Hotel Transilvânia. Já havíamos assistido Hotel Transilvânia 2 juntos. Eu gostei do filme, pois traz uma mensagem de tolerância e empatia àqueles que são diferentes de nós. O primeiro, também tem essa mensagem, mas traz outra igualmente potente: o amor de um pai por sua filha e a vontade de protegê-la frente aos perigos do mundo. Foi um momento de pai e filha muito legal. Tempo de qualidade (para lembrar do livro Cinco linguagens do amor). Assistimos abraçados e conversamos um pouco sobre o filme depois. 

Penso que podemos utilizar muitas coisas do mundo para ministrar no coração de nossas crianças. Trabalhar princípios através de conteúdos que em um primeiro momento não têm nada de cristãos. Isso tem o potencial de exercitar em nós e nelas a capacidade de dialogar com culturas diferentes, com valores diferentes. Não só formar diques e barreiras, mas construir pontes.

*Os textos publicados pelo Observatório Evangélico trazem a opinião e análise dos autores e não refletem, necessariamente, a visão dos demais curadores ou da equipe do site.


João Barros é evangélico há mais de 20 anos. Doutor em Filosofia e doutor em Ciências Sociais (UBA-AR), atualmente leciona no Programa de Pós-graduação em Integração Contemporânea da América Latina (PPGICAL) e no curso de Ciência Política e Sociologia da UNILA. É autor de Poder pastoral e cuidado de si em Foucault (2020) e Biopolítica no Brasil – uma ontologia do presente (2022). Também coordena o projeto Evangélicos e política na América Latina. Contato: joao[ponto]barros@unila[ponto]edu[ponto]br .