Será que todos os evangélicos concordam com a fala de Eduardo Bolsonaro sobre os professores?

Será que todos os evangélicos concordam com a fala de Eduardo Bolsonaro sobre os professores?

Em discurso polêmico, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) comparou professores a traficantes ao participar de um evento pró-armas no Distrito Federal

"O certo começa pela nossa família. Se nós, por exemplo, tivermos uma geração em que os pais prestem a atenção na educação dos filhos, tirem um tempo para ver o que eles estão aprendendo nas escolas, não vai ter espaço para professor doutrinador sequestrar as nossas crianças (...) Não tem diferença de um professor doutrinador para um traficante que tenta sequestrar e levar os nossos filhos para o mundo do crime. Talvez até o professor doutrinador seja ainda pior, porque ele vai causar discórdia dentro da sua casa, enxergando a opressão em todo o tipo de relação. Fala que o pai oprime a mãe, a mãe oprime o filho e aquela instituição chamada família tem que ser destruída”, acrescentou.

A fala de Eduardo Bolsonaro toca exatamente no tema mais caro para os evangélicos: a família.

Mas será que todos os evangélicos concordariam com tal pronunciamento?

Constantemente a extrema direita aciona o tema família justamente por ser um conceito extremamente caro para os evangélicos, assim como uma categoria bastante mobilizada pela Frente Parlamentar Evangélica.

A categoria família é central neste debate, pois através dela é também acionado outros temas, como sexualidade e gênero. Quando Eduardo Bolsonaro afirma que a família deve monitorar qual tipo de educação a criança recebe, ele quer dizer que os conceitos morais não devem ser questionados pelas escolas, assim como a escola não deve instigar o pensamento crítico. E seguindo a lógica da extrema direita, Eduardo busca um inimigo a ser combatido, e mais uma vez o inimigo é o professor.

Esse movimento se aproxima da ideia de homescholing, tambem mobilizada recentemente pela extrema direita e por setores conservadores da igreja evangélica. A ideia é uma espécie de privatização da educação e dos cuidados da criança em direção ao âmbito familiar.

Eduardo mobiliza tais ideias por dois motivos: primeiro porque sabe que polêmicas geram engajamento, e segundo porque busca apoio da parte conservadora da Frente Parlamentar Evangélica.

Embora a Frente Parlamentar Evangélica seja um bloco heterogêneo em suas denominações, se fortaleceu e foi ganhando cada vez mais destaque nas discussões parlamentares, principalmente em pautas ligadas à "defesa da moralidade cristã e da família", criando uma identidade comum em torno de temas relacionados à sexualidade, à educação sexual nas escolas e à reprodução da vida, fato que foi reforçado intensamente com a eleição do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro, em 2018.

Essa identidade tem duas facetas: por um lado atua como uma demarcação da presença evangélica em oposição aos privilégios da igreja católica na esfera pública ao longo da história social e política do país, e por outro lado se expressa como uma resistência aos avanços de direitos ligados às minorias, como o movimento feminista, negro, ambientalista e LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros), principalmente no tocante a questões relacionadas a gênero e sexualidade, uma vez que os avanços nessas pautas são vistos como uma ameaça ao modelo de família tradicional defendida por vertentes evangélicas conservadoras.

Em um movimento que acompanhou a construção democrática do país, foram se formulando novas estratégias de engajamento evangélico no espaço público brasileiro com o intuito de produção de um espaço onde haveria a possibilidade de reivindicação de pautas diversas.

Nesse sentido, Eduardo Bolsonaro busca usufruir do espaço público para disseminar ideias controvérsias, e assim colocar em pauta possíveis agendas e reinvidicações que podem mobilizar grupos da ala fundamentalista da igreja evangélica, com a clara intenção de gerar polarização e discórdia.

*Os textos publicados pelo Observatório Evangélico trazem a opinião e análise dos autores e não refletem, necessariamente, a visão dos demais curadores ou da equipe do site.


Manuela Löwenthal é Doutoranda em Ciências Sociais pela UNIFESP, pesquisa temas vinculados à Religião e Política no Brasil. Possui graduação em Ciências Sociais pela Universidade Estadual Paulista (2012), onde também obteve o título de mestre. É pesquisadora  do projeto Temático "Religião, Direito e Secularismo: A reconfiguração do repertório cívico no Brasil contemporâneo", financiado pela FAPESP.  Atua também como Professora de Sociologia na Rede Estadual Paulista.