React: Romilda Costa Motta sobre a fala de Senadora Eliziane Gama em resposta a Marco Feliciano

React: Romilda Costa Motta sobre a fala de Senadora Eliziane Gama em resposta a Marco Feliciano

A CPMI do 8 de Janeiro teve um novo momento de tensão entre a relatora, senadora Eliziane Gama, evangélica da Assembleia de Deus, e o deputado Pastor Marco Feliciano com acusações mútuas de desrespeito e publicações conflituosas nas redes sociais após uma reunião fechada.

Neste quadro, colaboradores reagem a fala da Senadora.

Romilda Costa Motta sobre a fala de Senadora Eliziane Gama em resposta a Marco Feliciano:

O embate entre dois membros da Assembleia de Deus – uma Senadora e um Deputado Federal - é uma marca patente de evidências que muitos/as insistem em ignorar, tanto dentro, quanto fora do contexto religioso: o público evangélico é muito heterogêneo. Há inúmeros “Marcos Feliciano”! Mas também existem “Elizianes Gama” – ufa!

A discussão ocorreu no espaço da política convencional e explicitou, além da diversidade entre evangélicos, o ambiente hostil ao qual mulheres estão submetidas quando ousam ocupar lugares de fala e de poder.  Também externalizou algumas mudanças – por mais lentas que sejam - que ocorrem no interior das instituições religiosas: pastores não são mais vistos como seres “inimputáveis” e já são confrontados, diante de desvios. De forma corajosa e estrategicamente racional, a Senadora manejou o vocabulário e referências do campo religioso, insistindo, veementemente que o “pregador de renome”, a quem, segundo ela, respeitou durante algum tempo, assumisse responsabilidades e compromissos de representar bem os “seguidores de Cristo”.

Arrisco afirmar que é possível que, no embate entre esses nomes da Assembleia de Deus, possa haver maior identificação e adesão por parte de um segmento representativo das comunidades evangélicas com a figura e posicionamentos do Pastor Marco Feliciano.

Isso porque o “horário nobre” do púlpito ainda é, na maioria dessas denominações, majoritariamente ocupado por figuras e perspectivas masculinas – algumas machistas e outras misóginas - como ressaltadas pela Senadora. Consequentemente, uma mulher que ousa olhar de frente um pastor e afirmar: “seu olhar e palavras não me intimidam”, não é bem vista. É provável que uma campanha de difamação seja colocada em prática, buscando destruir sua reputação como mulher-cristã, afinal, estamos falando de uma situação de questionamento duplo de autoridade: masculina e religiosa.

Embora pessoalmente eu tenha vibrado com a fala da Senadora Eliziane, guardo reservas acerca de uma recepção positiva entre núcleos hegemônicos – e quero considerar, especialmente, o feminino mais conservador.

Por sua vez, o embate travado permitiu a um público mais amplo ver um recorte da heterogeneidade que marca os núcleos evangélicos.

O ocorrido foi positivo, especialmente, para os/as que se distanciam da representação que tem sido mais publicizada – a ala dos “Felicianos”.

O espaço conferido para as/os “Elizianes” ainda é irrisório, absolutamente desigual. Mas esse perfil existe e resiste, fazendo-se necessário que seja reconhecido dentro e fora das instituições religiosas.

*Os textos publicados pelo Observatório Evangélico trazem a opinião e análise dos autores e não refletem, necessariamente, a visão dos demais curadores ou da equipe do site.


Romilda Costa Motta é Doutora em História pela Universidade de São Paulo. Cristã e feminista, suas pesquisas inserem-se na area de Historia das Mulheres e Relações de Gênero.