Um pouco mais complicado: Reflexões sobre o pentecostalismo periférico na Universidade

Um pouco mais complicado: Reflexões sobre o pentecostalismo periférico na Universidade

Esta semana conversei rapidamente com nosso curador, Prof. Juliano Spyer, sobre o estigma do pentecostal periférico na Universidade, especialmente a Pública. Não há dúvidas que isso acontece. Aliás, muito da abordagem sobre os evangélicos deste país obliteram que a sedução das classes mais altas se deu especialmente pela teologia da prosperidade encampada, em um primeiro momento, pelas igrejas do chamado pentecostalismo autônomo. De igual modo, esquecem que boa parte dos problemas com o fundamentalismo evangélico não está nas igrejas ligadas ao pentecostalismo. Elas são conservadoras, nos costumes, per se; entretanto, não podem ser chamadas de fundamentalistas.

O fundamentalismo requer um verniz pseudocientífico. Por isso ele precisa dos seminários, das faculdades de teologia confessionais, formação comum e requerida no protestantismo histórico. Mesmo o governo Bolsonaro exibindo no 1o e 2o escalão nomes das Igrejas Presbiteriana e Batista, a mídia seguiu creditando o comportamento e postura fundamentalista, a tentativa de tornar a política em serva da religião, aos pentecostais. Ledo engano. O fundamentalismo, desde seu nascedouro, é primeiramente ligado ao protestantismo histórico só atingindo outros subgrupos evangélicos por transbordamento. Nesse sentido não é justo confundir e misturar a sanha pelo poder de certos grupos do amplo espectro pentecostal com o amálgama entre religião e política patrocinado pelo fundamentalismo.

O estigma, entretanto, não se reduz a questão da análise política. Ele atinge outros ambientes como o universitário. Não são poucos os casos de pentecostais e de evangélicos sendo discriminados na universidade por conta da sua fé. Todavia, o acento pertence aos pentecostais.

Agora, esse estigma seria fruto do mais puro preconceito, espírito que deveria ser estranho ao mundo acadêmico, ou há algum elemento contributivo também? Penso que seja o resultado dos dois fatores.

Normalmente pentecostais crescem em comunidades de fé em que o diálogo é rarefeito, em que o questionamento é malvisto. Em comunidades pentecostais o estímulo é a obediência mais servil, a manutenção da visão idealizada da figura pastoral, a qual, contrariando o Salmo 8, se torna equivalente à figura angelical. Esta estrutura passa a ser introjetada nos fiéis que, conquanto a respeitem no espaço religioso, o projetam nos demais espaços. Isto atinge o lar, o trabalho e também a Universidade.

A fala do professor se torna potencializada, assim como seu eventual preconceito. Já a forma de fala do fiel, muita das vezes, é compreendida como autoritária, devido à estrutura na qual ela é dada.

De maneira similar, o pentecostal sofre com suas declarações afirmativas. Um exemplo é a apropriação do exemplo de Moisés com a Sarça no deserto. A noção de que o local que ele pisou era santo é transposta assertivamente para toda e qualquer inserção pessoal ou social do fiel. Ora, esse recurso a autoridade destoa do clima universitário. Cria barreiras; acirra os ânimos.

O que estamos tentando dizer? Parte da estigmatização do pentecostalismo periférico no âmbito acadêmico se deve ao preconceito deste com a religião, ainda mais com expressões menos compreensíveis para uma cultura que pretende ser racional. No entanto, parte se dá pela própria postura de alguns em transpor sua postura de fé para as relações no ambiente universitário. Nesses casos, a perseguição não se dá por outra razão que não a certeza da chatice. A bem da verdade, a chatice não é exclusivamente pentecostal; ela é sobretudo evangélica.

É ou não é um pouco mais complicado?

*Os textos publicados pelo Observatório Evangélico trazem a opinião e análise dos autores e não refletem, necessariamente, a visão dos demais curadores ou da equipe do site.


Pr. Dr. Sérgio Ricardo Gonçalves Dusilek  é Mestre e Doutor em Ciência da Religião (UFJF/MG); Pesquisador do Núcleo de Estudos e Pesquisa em Filosofia da Religião, da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF/MG); Pastor na Igreja Batista Marapendi (RJ/RJ); Professor do Seminário Teológico Batista Carioca. Autor de Bíblia e Modernidade: A contribuição de Erich Auerbach para sua recepção e co-organizador de: Fundamentalismo Religioso Cristão: Olhares transdisciplinares; e O Oásis e o Deserto: Uma reflexão sobre a História, Identidade e os Princípios Batistas. Contato: sdusilek@gmail.com